A harmonização facial é um conjunto de procedimentos estéticos não cirúrgicos que visam melhorar a harmonia e simetria do rosto.
Esses procedimentos têm ganhado popularidade nos últimos anos, especialmente pela sua capacidade de proporcionar resultados significativos sem a necessidade de intervenções cirúrgicas invasivas.
Neste artigo, vamos explorar em detalhes o que é a harmonização facial, quais profissionais podem executar esses procedimentos e a posição dos esteticistas nesse cenário, respaldada por uma legislação específica.
O que é Harmonização Facial?
Harmonização facial é um termo amplo que engloba uma série de técnicas e procedimentos estéticos destinados a melhorar a aparência do rosto. Entre os procedimentos mais comuns estão:
- Aplicação de Toxina Botulínica (Botox): Utilizado para suavizar rugas e linhas de expressão.
- Preenchimento com Ácido Hialurônico: Utilizado para preencher sulcos, rugas, aumentar o volume dos lábios e redefinir o contorno facial.
- Bioestimuladores de Colágeno: Produtos que estimulam a produção de colágeno, melhorando a firmeza e elasticidade da pele.
- Fios de Sustentação: Utilizados para promover um efeito lifting no rosto sem a necessidade de cirurgia.
- Peelings Químicos: Procedimentos que promovem a renovação da pele através da aplicação de substâncias químicas, como o peeling de fenol.
- Microagulhamento: Técnica que utiliza agulhas finas para estimular a produção de colágeno e melhorar a textura da pele.
- Entre outros…
Quem Pode Executar a Harmonização Facial?
A questão de quem está autorizado a realizar procedimentos de harmonização facial é complexa e varia conforme a legislação de cada país.
No Brasil, várias categorias profissionais têm buscado se qualificar para oferecer esses serviços, incluindo médicos, dentistas, biomédicos, farmacêuticos, enfermeiros, fisioterapeutas e esteticistas.
Apesar disso, é importante saber que as resoluções publicadas pelos conselhos de diversas categorias profissionais, que supostamente habilitam a sua própria categoria para trabalhar com procedimentos estéticos, muitas vezes são anuladas pela justiça.
Isso acontece porque, conforme o Poder Judiciário, o que vale é o que está previsto na lei. Resoluções de conselhos não são leis, mas sim normas infralegais que, em alguns casos, invadem a competência do Poder Legislativo, expandindo as competências da sua própria categoria para atuar na área de outro profissional.
Em síntese, a função dos conselhos é a de fiscalizar a sua categoria, com base no que está definido na lei que regulamentou a profissão.
A palavra “esteta” não existe na lei, trata-se de uma expressão sinônima de esteticista que foi adotada por profissionais sem formação na área, influenciados pelas resoluções de seus conselhos de classe, como “biomédicos estetas”, “enfermeiros estetas”, “farmacêuticos estetas”, entre outros.
Conforme a Constituição Federal, para fins de exercício profissional, o que vale é o que está previsto na lei, e não em resoluções ou normas infralegais de conselhos ou órgãos relacionados. Vejamos: “é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer” (Art. 5º, inciso XIII).
Vejamos agora alguns casos julgados pelo Poder Judiciário, que já suspendeu e anulou diversas resoluções de conselhos, que não têm competência para legislar sobre o assunto:
Ressalte-se, que os profissionais não-médicos da área de saúde estão impedidos de praticar atos médicos, em procedimentos estéticos tidos como invasivos em maior ou menor grau, porquanto não há respaldo legal em simples regulamentações emitidas pelos Conselhos, pois o normativo infralegal não tem o condão de restringir ou ampliar o exercício profissional. Ou seja, a lei dispõe sobre os limites do campo de atuação profissional, considerando a jurisdição dos respectivos órgãos de fiscalização profissional, nos termos do inciso XIII, artigo 5º da Constituição Federal.(…) Assim, independentemente da simplicidade do procedimento estético invasivo e dos produtos utilizados, in casu, está demonstrado que a Resolução 573/2013 constitui ato eivado de ilegalidade, ultrapassando os limites da norma de regência da área de Farmácia. (AC 0061755-88.2013.4.01.3400, DESEMBARGADORA FEDERAL ÂNGELA CATÃO, TRF1 – SÉTIMA TURMA, e-DJF1 20/04/2018)
A Resolução n.º 669/2018, do Conselho Federal de Farmácia, é até mais permissiva e imprudente que a Resolução n.º 573/2013, já que sequer estabelece a título de ilustração quais seriam os procedimentos estéticos passíveis de realização por farmacêuticos, deixando ao bel-prazer do profissional definir se a legislação e a literatura especializada os consideram ou não como invasivos (art. 2º), e, além disso, desrespeita as diretrizes do art. 5º e art. 6º da Lei n. 13.643/2018, que já tratam sobre as funções do esteticista. (PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL, 1002232-21.2019.4.01.3400, Juiz Federal Marllon Sousa, 7a Vara Federal da SJDF)
Apelação se volta contra sentença que julgou parcialmente procedente a ação civil pública para declarar a nulidade parcial da Resolução COFEN nº 0529/2016. Em consequência, determinou a suspensão de seus efeitos relativamente aos procedimentos de “Micropuntura, Laserterapia, Depilação a laser, Criolipólise, Escleroterapia, Intradermoterapia/ Mesoterapia, Prescrição de Nutracêuticos/Nutricosméticos e Peeligs”. (…) Dessarte, e considerando-se o risco de danos efetivos ocasionados à saúde dos inúmeros pacientes que porventura possam a vir ser afetados, não se mostra descabida a proibição do exercício de tais funções pelos profissionais de enfermagem, com a suspensão do que prevê a Resolução COFEN nº. 0529/2016, mercê da possível extrapolação na atividade regulamentar efetuada por este ato normativo frente à previsão legal das atuações profissionais de enfermeiros e de médicos. 8. Apelação desprovida. Mcp (TRF-5 – Ap: 08042101220174058400, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA, Data de Julgamento: 27/10/2020, 2ª TURMA)
Tal o cenário, nada obstante o legislador tenha remetido a disciplina à normatização administrativa, não poderia a Administração prever, por ato infralegal, atribuições contrárias ao estabelecido na Lei nº 6.684/79, extrapolando seu poder normativo. Tais as razões, JULGO PROCEDENTES os pedidos deduzidos na peça inaugural, nos termos do art. 487, I do CPC, para determinar a anulação da Resolução nº 241/2014 do Conselho Federal de Biomedicina. (PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL, 0067987-48.2015.4.01.3400, Juiz Federal MARCOS JOSÉ BRITO RIBEIRO, 13ª Vara Federal Cível da SJDF)
Sem dúvidas, tais resoluções e normas infralegais violam expressamente a competência privativa da União para legislar sobre a organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões (Art. 22, inciso XVI, da Constituição Federal), bem como para organizar, manter e executar a inspeção do trabalho (Art. 21, inciso XXIV, da Constituição Federal).
Normalmente, o requisito apresentado pelos conselhos para expandir as competências da sua própria categoria profissional é a conclusão de uma pós-graduação ou, até mesmo, estágios na área da estética durante a graduação. Todavia, além de tais requisitos serem desprovidos de legalidade, ainda se esbarram na jurisprudência sobre cursos de pós-graduação, vejamos:
Acrescento que a pós-graduação não habilita profissionais à competências, essa habilitação é feita na própria graduação, porém, tendo o aluno um diploma universitário, e conseguindo ser aceito pelo programa de pós-graduação, pode fazer pós-graduação em outras áreas do conhecimento, o que não significa que poderá exercer certas atividades que dependem de competências atribuídas em determinada graduação. (TJ-RS – Apelação Civel: 70050999333 RS, Relator: Ney Wiedemann Neto, Data de Julgamento: 13/12/2012, Sexta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/01/2013)
Atualmente, a única categoria profissional que, de fato, possui respaldo legal para a execução de procedimentos estéticos, com exceção dos atos privativos da classe médica, é a categoria dos Esteticistas e dos Técnicos em Estética, por força da Lei Federal n.º 13.643, de 3 de abril de 2018, que em seu art. 1º, parágrafo único, faz referência ao art. 4º da Lei nº 12.842, de 10 de julho de 2013 (Lei do Ato Médico).
Quais são os atos privativos dos médicos?
Os procedimentos estéticos privativos dos médicos estão previstos no art. 4º, inciso III, da Lei do Ato Médico (Lei 12.842/2013), vejamos o que ele diz:
Art. 4º São atividades privativas do médico:
III – indicação da execução e execução de procedimentos invasivos, sejam diagnósticos, terapêuticos ou estéticos, incluindo os acessos vasculares profundos, as biópsias e as endoscopias;
Com isso, podemos concluir que procedimentos estéticos privativos dos médicos são aqueles considerados invasivos. O conceito legal de procedimento invasivo, por sua vez, está estabelecido no artigo 4º, § 4º, inciso III, da Lei do Ato Médico. Vejamos o que diz a lei:
§ 4º Procedimentos invasivos, para os efeitos desta Lei, são os caracterizados por quaisquer das seguintes situações:
I – invasão da epiderme e derme com o uso de produtos químicos ou abrasivos;(VETADO)
II – invasão da pele atingindo o tecido subcutâneo para injeção, sucção, punção, insuflação, drenagem, instilação ou enxertia, com ou sem o uso de agentes químicos ou físicos;(VETADO)III – invasão dos orifícios naturais do corpo, atingindo órgãos internos.
Com base nesse texto, concluímos que um procedimento só é considerado invasivo se atingir os “órgãos internos” do corpo humano (como as vísceras mostradas na imagem abaixo).
Esta interpretação é reforçada pela análise dos incisos vetados na mesma lei, que expandiam a definição de procedimento invasivo para incluir injeções no tecido subcutâneo, entre outros. As razões dos vetos, apresentadas pelo Poder Executivo na mensagem nº 287, de 10 de julho de 2013, explicam que procedimentos invasivos não podem ser amplamente definidos de maneira imprecisa, atribuindo exclusivamente aos médicos uma vasta gama de procedimentos. Deve-se considerar uma abordagem multiprofissional. Vejamos a transcrição da mensagem oficial:
Incisos I e II do § 4º do art. 4º
Razões dos vetos
Ao caracterizar de maneira ampla e imprecisa o que seriam procedimentos invasivos, os dois dispositivos atribuem privativamente aos profissionais médicos um rol extenso de procedimentos, incluindo alguns que já estão consagrados no Sistema Único de Saúde a partir de uma perspectiva multiprofissional. Em particular, o projeto de lei restringe a execução de punções e drenagens e transforma a prática da acupuntura em privativa dos médicos, restringindo as possibilidades de atenção à saúde e contrariando a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Sistema Único de Saúde. O Poder Executivo apresentará nova proposta para caracterizar com precisão tais procedimentos.
A imagem a seguir ilustra que os órgãos internos são protegidos pelo músculo. Assim, a epiderme, a derme, o tecido subcutâneo e o músculo são considerados órgãos externos para efeitos legais.
Além disso, foram vetados os incisos I, II e IV do § 5º do art. 4º da Lei do Ato Médico, que exigiam prescrição médica para a aplicação de injeções subcutâneas, intradérmicas, intramusculares e intravenosas, entre outros procedimentos. As razões dos vetos foram apresentadas na mesma mensagem citada anteriormente, vejamos:
Incisos I, II e IV do § 5º do art. 4º
I – aplicação de injeções subcutâneas, intradérmicas, intramusculares e intravenosas, de acordo com a prescrição médica;
II – cateterização nasofaringeana, orotraqueal, esofágica, gástrica, enteral, anal, vesical, e venosa periférica, de acordo com a prescrição médica;
IV – punções venosa e arterial periféricas, de acordo com a prescrição médica;
Razões dos vetos
Ao condicionar os procedimentos à prescrição médica, os dispositivos podem impactar significativamente o atendimento nos estabelecimentos privados de saúde e as políticas públicas do Sistema Único de Saúde, como o desenvolvimento das campanhas de vacinação. Embora esses procedimentos comumente necessitem de uma avaliação médica, há situações em que podem ser executados por outros profissionais de saúde sem a obrigatoriedade da referida prescrição médica, baseados em protocolos do Sistema Único de Saúde e dos estabelecimentos privados.
Portanto, fica claro que procedimentos injetáveis ou com peelings químicos, em suas diversas formas (intradérmicos, subcutâneos, intravenosos ou intramusculares), não são considerados invasivos. Caso contrário, somente médicos poderiam realizar tatuagens, micropigmentação de sobrancelhas ou aplicar injeções, o que afetaria o direito de vários profissionais, como enfermeiros, dentistas, biomédicos, tatuadores, micropigmentadores, além de esteticistas e técnicos em estética.
Os vetos na Lei do Ato Médico eliminaram, inclusive, a necessidade de prescrição médica, exceto para substâncias e medicamentos controlados, conforme a Portaria do Ministério da Saúde – SVS/MS n.º 344, de 12 de maio de 1998.
Conforme o art. 6º, inciso V, da Lei Federal 13.643, de 3 de abril de 2018, o Esteticista é o profissional competente para “a elaboração do programa de atendimento, com base no quadro do cliente, estabelecendo as técnicas a serem empregadas e a quantidade de aplicações necessárias”.
O Esteticista ainda é o profissional competente para assumir a responsabilidade técnica pelos centros de estética (Art. 6º, inciso I).
A referida lei afastou da competência dos esteticistas somente os atos privativos da classe médica (art. 1º, Parágrafo único).
Dica importante: “minimamente invasivo” não existe!
A terminologia “minimamente invasivo” é frequentemente utilizada incorretamente por alguns profissionais ao se referirem a procedimentos injetáveis. Todavia, do ponto de vista legal, é importante esclarecer que um procedimento é invasivo ou não é invasivo. O termo “minimamente” não existe na lei e, para evitar confusões, não deve ser utilizado.
Considerações Finais
A harmonização facial é uma área em expansão que oferece inúmeras possibilidades para quem busca melhorar a aparência e a autoestima. No entanto, é fundamental que os procedimentos sejam realizados por profissionais qualificados e habilitados, garantindo segurança e eficácia.
De todos os profissionais de saúde que lutam pelo direito de realizar procedimentos de harmonização facial, o nosso escritório entende que os esteticistas são aqueles que apresentam o menor risco de enfrentar problemas jurídicos em uma visão de longo prazo, desde que sejam respeitados os atos privativo da classe médica, como as cirurgias plásticas e os procedimentos invasivos (que não se confundem com injetáveis).
Vale ressaltar que as competências dos esteticistas, previstas no art. 6º da Lei 13.643/2018, não se confundem com as dos técnicos em estética, previstas no art. 5º da referida lei.
Essa distinção é importante porque os esteticistas são profissionais graduados em um curso de nível superior, competindo a eles a responsabilidade técnica pelos centros de estética, conforme determina o inciso I do art. 6º da referida lei, bem como o direito estabelecer o programa de atendimento, com base no quadro do cliente, estabelecendo as técnicas a serem empregadas e a quantidade de aplicações necessárias (inciso V do art. 6º).
É importante destacar que as resoluções publicadas pelos conselhos de outras categorias profissionais muitas vezes são anuladas pela justiça, por serem consideradas normas infralegais. Ou seja, as resoluções não têm o mesmo peso de uma lei federal e, portanto, podem ser contestadas judicialmente.
A regulamentação clara e específica para os esteticistas contribui para a segurança dos pacientes e para o reconhecimento da importância desses profissionais na área da estética.
Antes de optar por qualquer procedimento de harmonização facial, é essencial consultar um profissional qualificado e buscar referências sobre sua formação e experiência. Assim, é possível alcançar os resultados desejados com segurança e tranquilidade.
Vale destacar que qualquer profissional pode ser responsabilizado por eventual negligência, imprudência ou imperícia, sendo recomendada a capacitação através de cursos relacionados às técnicas das quais o profissional pretende executar. O domínio da técnica é fundamental para minimizar os riscos, priorizando a saúde e o bem-estar do paciente.
Por fim, é necessário que a clínica ou centro de estética onde o procedimento será realizado esteja devidamente regularizada, com todas as licenças necessárias para as suas atividades, bem como contratos e termos de consentimento atualizados, evitando problemas fiscais ou violações ao Código de Defesa do Consumidor.